Esta semana estamos publicando a última entrevista da série que conversou com os pesquisadores da equipe do edital “Diagnóstico dos Serviços Prisionais no Brasil”. A entrevista desta edição é com a pesquisadora Ana Gabriela Mendes Braga, coordenadora da equipe que estuda nove estados da Região Nordeste do Brasil.
Ana é doutora em Criminologia e Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), com estágio doutoral junto ao Departamento de Antropologia da Universitat de Barcelona. Docente da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), coordena o Núcleo de Estudos e Pesquisa em Aprisionamentos e Liberdades (Nepal) e o projeto de Extensão CADEIA, na Cadeia Feminina de Franca.
A pesquisadora é autora do livro “Preso pelo Estado e vigiado pelo Crime: as leis do cárcere e a construção da identidade na prisão” publicado em 2013, pela Lumen Juris. No Projeto Pensando o Direito, coordenou a pesquisa “Dar à luz na sombra: condições atuais e futuras de exercício de maternidade por mulheres em situação de prisão”.
1. Qual a sua visão sobre o atual cenário do sistema prisional brasileiro?
Na minha visão, o cenário do atual sistema penal brasileiro é complicadíssimo. Por uma questão estrutural, o encarceramento, em qualquer lugar do mundo, não atende aos fins a que se propõe e custa caro, do ponto de vista econômico e social. Não podemos continuar reafirmando, como temos feito há mais de dois séculos, a possibilidade de ressocializar, reabilitar, reeducar, ou qualquer outra forma de inserção social por meio da prisão.
Por vezes, atribui-se o fracasso da prisão no Brasil às questões conjunturais, à falta de recursos humanos e materiais, e é comum ouvirmos que a solução seria a construção de mais prisões ou mais investimentos. Porém, essa equação não fecha. De um lado porque o investimento nunca será o suficiente frente ao exponencial aumento de prisões e, de outro, porque as melhorias conjunturais não irão modificar a estrutura violenta e seletiva que sustenta o sistema de justiça criminal.
Apesar do cenário não ser nada promissor, temos mais de meio milhão de vidas apodrecendo atrás das grades. Logo, é fundamental por meio de pesquisas, intervenções, políticas públicas e mobilizações retomarmos a proposta abolicionista e enfrentar o tema nas duas frentes de luta: a longo prazo, pelo fim do encarceramento e, a curto, para a melhoria das condições atuais.
2. O que motivou você a participar desse edital?
Primeiro, fui motivada pela experiência anterior na coordenação de uma pesquisa do Projeto Pensando o Direito, a qual me possibilitou pensar e articular metodologias empíricas no Direito e, devido ao seu caráter aplicado, produzir conhecimento com objetivo de impactar diretamente a realidade social.
Além disso, desenvolvo uma linha de pesquisa na Unesp, no âmbito da pós-graduação e do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Aprisionamentos e Liberdades, que tem como objeto “personagens do sistema de justiça criminal”.
Outro ponto foi a possibilidade de trabalhar com uma equipe interessante e experiente de pesquisadoras e pesquisadores. No meu grupo, conto com a vice-coordenação do José de Jesus Filho, que soma experiência na metodologia quantitativa e vasto conhecimento da realidade prisional brasileira, devido à sua atuação na Pastoral Carcerária. Ainda temos o apoio da Vivian Calderoni, que tem um mestrado sobre o tema. Além disso, tem sido fundamental o contato e a troca com a Christiane e o André, os coordenadores dos outros dois recortes da pesquisa.
3. Como será a abordagem da pesquisa nos estados que estão sob sua coordenação? Quais são eles?
O campo da pesquisa compreende nove estados do Nordeste do país: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Em um primeiro momento, pretendemos, a partir da intermediação do Depen, apresentar a pesquisa para as secretarias estaduais, os sindicatos de Agentes Penitenciários e escolas de formação, com o objetivo de reunir informações sobre a organização penitenciária local e seus servidores. Esse contato também será essencial para preparar as outras duas fases do campo: survey e visita s in loco, na medida em que dependemos da adesão dos secretários, diretores e servidores locais para sucesso da pesquisa.
Em seguida, procederemos à aplicação de survey com questões fechadas aos agentes prisionais, que será dividido em três partes: perfil-sócio econômico, formação e opinião.
E, em um terceiro momento, procederemos às visitas in loco a no mínimo cinco diferentes tipos de estabelecimentos da região Nordeste, a partir de uma amostra construída em parceria com o Depen, não-aleatória, mas significativa da região. Nas visitas, serão realizadas entrevistas semi-estruturadas com: diretor, diretor de disciplina, corpo técnico, e alguns agentes, de modo a contrastar e complementar qualitativamente as informações obtidas nas etapas anteriores e compreender as relações de poder entre servidores desses estabelecimentos.
4. Como você acha que o resultado da pesquisa poderá contribuir para a qualidade dos serviços prisionais?
Apesar de os servidores penitenciários serem personagens centrais da execução criminal, eles têm ocupado papeis secundários na academia e no planejamento de políticas penitenciárias. Durante mais de dez anos de contato direto com a prisão, foi recorrente escutar dos agentes que o preso tem mais oportunidades que eles, que os “direitos humanos não ligam para o agente”.
Interpreto esses discursos como uma necessidade de escuta, de reconhecimento, de visibilidade para esse grupo. Nesse mesmo sentido, foi a conclusão dos Grupos de Trabalho com Agentes Penitenciários organizado pelo Depen, apontando para a necessidade de reconhecer a carreira, discutir as funções, a identidade, formação, etc.
Logo, a pesquisa visa justamente a atender essa demanda e pensar o sistema prisional a partir dos seus servidores. Essa iniciativa é fundamental para produzirmos dados atualizados sobre o serviço penitenciário no Brasil e pensar em projetos normativos que regulem a profissão. Aprofundar o conhecimento acerca dos servidores prisionais e pensar em modificações nas suas estruturas e funções, pode trazer um impacto significativo no sistema prisional e na vida de milhões de pessoas presas, funcionários e suas respectivas famílias.
Os temas abordados na edição anterior foram muito estimulantes para o investimento em tecnologia da informação e comunicação.
Joseane Rocha,
http://www.educamundo.com.br
De projeto
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Aguardando pelo próximo evento
Roberto
http://metodologiaagil.com