24 de junho de 2014 Tópicos: Debates Públicos

Opinião de especialista: Sérgio Amadeu e o Marco Civil da Internet

A Lei 12.965/14, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil, conhecida como Marco Civil, entrou em vigor ontem (23/06). Seu texto prevê que alguns dos pontos discutidos tanto no debate público ocorrido entre 2009 e 2010, como no próprio Congresso Nacional, sejam regulamentados por decreto presidencial.

A presidenta Dilma Rousseff declarou, durante o evento de lançamento da Política Nacional de Participação Social, que a regulamentação do Marco Civil da Internet será feita por meio de debate público, nos mesmos moldes em que seu texto foi construído.

Para qualificar o debate em torno dos pontos que serão regulamentados em debate público do Marco Civil da Internet, o Projeto Pensando o Direito escutará uma série de especialistas que participaram da construção do projeto.

Iniciamos com uma entrevista exclusiva com o professor doutor Sérgio Amadeu da Silveira, da Universidade Federal do ABC (UFABC), representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI), conhecido por suas pesquisas e publicações na área de comunicação e tecnologia, práticas colaborativas na Internet e a teoria da propriedade dos bens imateriais.

Confira abaixo a entrevista exclusiva com Sérgio Amadeu sobre o Marco Civil da Internet e a expectativa com relação à sua regulamentação.

Pensando o Direito: Quais os avanços poderão ser vistos com a entrada em vigor do Marco Civil da Internet?

Sérgio Amadeu: O Marco Civil consolida em uma Lei os princípios que fizeram a Internet livre, aberta, criativa e democrática. Em primeiro lugar, está assegurado o princípio da neutralidade da rede. As empresas de telecomunicação não poderão filtrar ou bloquear nossa comunicação só por serem donas dos cabos por onde trafegam nossos bits. Elas devem ser neutras em relação ao fluxo de informação.

Em segundo lugar, o Marco Civil garante a privacidade e diz que os provedores de conexão não podem armazenar os dados da nossa navegação em rede. Terceiro, a Lei dá estabilidade jurídica àqueles que têm sites, plataformas ou serviços na Internet. Nenhum provedor de aplicação é responsável por conteúdos postados por terceiros. Só serão responsabilizados se descumprirem uma ordem judicial. Existem outros pontos também muito importantes, mas estes, aqui descritos, são fundamentais.

Pensando o Direito: O que muda para o internauta com a entrada da lei em vigor?

Sérgio Amadeu: Espero que nada. O cidadão conectado deve continuar podendo usar a Internet livremente, sem censura, sem bloqueio das operadoras, sem necessidade de autorização para criar, ou usar, um novo aplicativo, ou tecnologia. O que melhora com o Marco Civil é a proteção de sua privacidade e sua liberdade de uso na rede. Quando esses direitos forem atacados, o cidadão agora tem uma Lei e, em breve, o detalhamento da Lei em um regulamento que permitirá a defesa de sua cidadania digital.

Pensando o Direito: E para as empresas? Como deverão se adequar para cumprir o que é estabelecido pela nova Lei?

Sérgio Amadeu: A resposta desta pergunta dependerá da regulamentação do Marco Civil. Por exemplo, a Lei manda apenas e tão somente os administradores de sistemas autônomos (empresas que possuem e distribuem IPs conforme uma política própria) guardarem os nossos registros de conexão, mas não define como deve ser essa guarda.

No seu artigo 15, para poder aprovar o Marco Civil, seus defensores tiveram que aceitar a famigerada guarda de logs de aplicação. Isso será um grande problema, pois precisaremos definir no regulamento que as empresas não possam manipular nem vender estes dados armazenados. Não podemos aceitar que sejam cruzados e vendidos após o período de seis meses. Não podemos estimular uma economia da interceptação e da intrusão.

Enfim, agora precisamos definir com muita clareza como será a regulamentação do Marco Civil para que as empresas possam cumprir os princípios da Lei.

Pensando o Direito: A presidenta Dilma Rousseff já afirmou publicamente que a regulamentação da Lei será feita em debate público na internet, nos mesmos moldes em que foi construída. Na sua visão quais são os benefícios e desafios deste processo?

Sérgio Amadeu: Sem dúvida alguma, a presidenta Dilma está no caminho certo. Uma regulamentação equivocada pode anular as conquistas democráticas e tudo que conquistamos na garantia da liberdade, privacidade, criatividade e neutralidade da rede.

Por isso, considero fundamental que a sociedade participe da formulação e dos debates da regulamentação do Marco Civil. Esse processo participativo deve ser transparente e também online, permitindo que todas as regiões do país participem.

É muito difícil encontrar elementos negativos em um processo de regulamentação que efetivamente ouça a sociedade. Obviamente, para aqueles que buscam uma regulamentação que atendam mais os interesses de grandes corporações as práticas participativas e deliberativas em rede podem não ser convenientes.


Confira também uma lista de perguntas e respostas frequentes sobre o Marco Civil da Internet.

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8 comentários em “Conheça o projeto Pensando o Direito”

  1. Joseane Rocha disse:
    Quando haverá outra edição do evento?
    Os temas abordados na edição anterior foram muito estimulantes para o investimento em tecnologia da informação e comunicação.
    Joseane Rocha,
    https://www.educamundo.com.br
  2. duda disse:
    Adorei gostaria muito de participar
    De projeto
  3. Thelma Regina da Costa Nunes disse:
    Adorei,gostaria muito de participar desse participar desse projeto.
  4. Maria Sueli Rodrigues de Sousa disse:
    A página do ipea não abre desde ontem que tento. Vcs sabem informar o que está ocorrendo?
    1. Pensando o Direito disse:
      Olá, a página está com um problema técnico. Iremos prorrogar as inscrições.
  5. Antônio Menezes Júnior disse:
    Pesquisa super relevante, muito bem estruturada e indica conclusões interessantes, algumas já conhecidas no cotidiano de muitos que trabalham no ramo, e a algumas questões ainda pouco decifradas. Tive o privilégio de conhecer ao vivo, um conjunto de exposições dos próprios autores, meses atrás. Um extraordinário trabalho e produção de conhecimento. Atrevo-me apenas a sugerir que a pergunta inicial seja diferente da atual, para o futuro, e para reflexão. A pergunta inicial enseja uma relação direta entre alcances de um processo de regularização e os instrumentos jurídico-urbanísticos disponíveis, mas e as pessoas, e o conhecimento em torno deles ??? É sabido que os instrumentos em si não são autônomos, precisam ser conhecidos, discutidos, e sua implementação precisa ser ajustada a cada realidade. Portanto, melhor que a pergunta sugira o que é preciso para os instrumentos jurídico-urbanísticos tenham efetividade na realidade dos municípios.
  6. Roberto disse:
    Esse tipo de evento é realmente muito importante. alem de ser contra a corrupção, promove o desenvolvimento de idéias inovadoras.
    Aguardando pelo próximo evento

    Roberto
    https://metodologiaagil.com

  7. Humberto disse:
    Ótima atitude!!

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